No último dia 22 de março, a CVM publicou a Instrução CVM 584/17, que alterou e acrescentou dispositivos às Instruções CVM 400/03 e 490/09, e reformulou as regras que até então disciplinavam os programas de distribuição de valores mobiliários, com o objetivo de fomentar seu uso pelas companhias abertas.
Os programas de distribuição de valores mobiliários constituem mecanismo à disposição de companhias abertas que possuem interesse em realizar, em momento futuro, ofertas públicas de distribuição dos valores mobiliários por elas emitidos. A principal vantagem dos programas de distribuição é antecipar a análise dos documentos e informações exigidos pela CVM para o registro de ofertas públicas, permitindo, assim, que o emissor consiga aproveitar eventuais “janelas de oportunidade” no mercado, sem ter de passar pelo processo de registro de oferta pública, cujo prazo de duração é, muitas vezes, incompatível com a volatilidade das condições de mercado e as necessidades de captação das companhias.
As novas regras preveem que apenas debêntures simples, não conversíveis ou permutáveis em ações, e notas promissórias podem ser objeto de ofertas públicas realizadas com o uso das vantagens dos programas de distribuição de valores mobiliários (art. 11, parágrafo único, ICVM 400/03). A regulação anterior não trazia limitação quanto à espécie de valores mobiliários que poderiam ser ofertados por meio de programas de distribuição.
A esse respeito, a minuta original da instrução, submetida aos comentários de participantes do mercado por meio da audiência pública SDM 04/16, limitava os programas de distribuição a debêntures simples. Apesar das sugestões recebidas pela CVM sobre o assunto, com o objetivo de se incluírem outros títulos de dívida não conversíveis, como os certificados de recebíveis imobiliários (CRI) e os certificados de recebíveis do agronegócio (CRA), a CVM estendeu os programas de distribuição apenas a notas promissórias, além das debêntures simples. A justificativa dada para a restrição dos valores mobiliários abrangidos pelos programas de distribuição foi a promoção da assimilação gradativa, pelo mercado, dos desdobramentos das novas regras, de modo a serem aperfeiçoadas ao longo do tempo. A CVM, contudo, não descartou eventual alargamento do rol de valores mobiliários passíveis de serem ofertados publicamente por meio de programas de distribuição em revisões futuras da norma.
Para se valer dos programas de distribuição, a companhia aberta interessada deve cumprir os seguintes requisitos: (i) ter obtido o registro de emissor de valores mobiliários na CVM e estar em fase operacional com no mínimo 24 meses de antecedência em relação à data de pedido do registro do programa; (ii) ter realizado oferta pública registrada de debêntures simples e/ou notas promissórias no valor mínimo total de R$ 500 milhões nos últimos 48 meses anteriores à data do pedido de registro do programa de distribuição (para o exercício social de 2017, o prazo foi estendido para 60 meses) ou ter ações em circulação (free float) com valor igual ou superior a R$ 2 bilhões de reais, de acordo com a cotação de fechamento no último dia útil do trimestre anterior à data do pedido de registro do programa de distribuição; e (iii) não ter deixado de cumprir tempestivamente, nos 12 meses anteriores à data de pedido do registro do programa, os prazos de entrega do formulário de referência e das demonstrações financeiras anuais e trimestrais (art. 11, incisos I, II e III, ICVM 400/03; e art. 7º, ICVM 584/17).
Após o registro do programa de distribuição, a emissora poderá requerer o registro automático da oferta pública de distribuição vinculada ao programa registrado, mediante a atualização de informações e apresentação de determinados documentos (art. 12-E, ICVM 400/03).
É, contudo, vedada a realização de oferta pública vinculada a programa de distribuição de valores mobiliários pela companhia aberta: (i) que não tenha entregado tempestivamente o formulário de referência e as demonstrações financeiras anuais e trimestrais, nos 12 meses anteriores à data do pedido de registro da oferta; (ii) cujas demonstrações financeiras base para o pedido de registro automático estejam acompanhadas de relatório de auditoria independente que contenha opinião modificada sobre as demonstrações financeiras ou seção separada contendo incerteza relevante relacionada à continuidade operacional da empresa; ou (iii) que tenha deixado de pagar dívidas relevantes (empréstimos e financiamentos) e não tenham apresentado informações a esse respeito, em nota explicativa, na última demonstração financeira anual ou trimestral enviada à CVM (art. 12-E, §1º, ICVM 400/03).
Os critérios de elegibilidade da norma são propositalmente restritivos. Segundo a CVM, o objetivo é “capturar o grau de exposição e de acompanhamento dos emissores pelo mercado”, nos termos do relatório da audiência pública SDM 04/16, franqueando acesso aos programas de distribuição apenas às companhias abertas já conhecidas e acompanhadas pelo mercado.
Entre as demais novidades da Instrução CVM 584/17, destacam-se) (i) o aumento do prazo dos programas de distribuição de 2 para 4 anos, contados do seu registro pela CVM (art. 12-B, ICVM 400/03); (ii) a ausência de obrigatoriedade de prévia autorização da CVM para utilização de material publicitário em ofertas vinculadas ao programa de distribuição (art. 12-G, ICVM 400/03); e (iii) a possibilidade de o emissor divulgar a qualquer tempo após o registro do programa, mesmo antes do protocolo do pedido de registro da oferta na CVM, o suplemento preliminar ao prospecto (art. 12-F, ICVM 400/03).
De acordo com dados obtidos através do site da CVM, atualmente não há qualquer pedido de registro de programa de distribuição de valores mobiliários em exame pela autarquia e os últimos programas arquivados são anteriores a 2014 (não houve arquivamentos de programas de distribuição de valores mobiliários em 2015, 2016 e 2017)1. Espera-se que a nova instrução possa contribuir para mudar essa realidade, em linha com o objetivo regulatório que motivou sua edição pela CVM.